O início de 2009 trouxe expectativas mas também muita apreensão ao torcedor ramalhino, pelo receio de que o time decepcione numa das temporadas mais importantes de sua existência. As mensagens postadas na mail list Ramalhonautas variavam do otimismo à cornetagem explícita, passando por todos os tons intermediários. Mas bastaram duas derrotas pela contagem mínima nas duas primeiras partidas pelo Paulistão para que o clima de apocalipse se instalasse... O que prova duas coisas: o verdadeiro torcedor do Ramalhão é exigente ao extremo e não admite menos que a perfeição; e também é um apaixonado pelo clube, do contrário estaria pouco ligando (pois o oposto do amor não é o ódio, e sim a indiferença).
As críticas mais frequentes na lista referem-se à qualidade dos reforços trazidos para substituir os atletas que deixaram o clube após a campanha vitoriosa na Série B (“um bando de refugos”), e que com esse time “medíocre” o Ramalhão “será rebaixado tanto no Paulistão como no Brasileiro”. Mas o posicionamento mais contundente foi de um ramalhino (ou a esta altura já seria um ex-ramalhino?) que declarou-se arrependido por haver torcido por 20 anos pelo acesso do Ramalhão, pois quem alcançou a elite do Brasileiro não foi o E.C. Santo André e sim a SAGED, e que doravante torcerá pelo fracasso da equipe.
Terão fundamento tais críticas? Como diria o açougueiro, vamos por partes.
Em 2008, o Santo André iniciou a temporada com o mesmo elenco do ano anterior, e ao longo da temporada trouxe alguns reforços. Com isso, teve o benefício do entrosamento do grupo desde o início, o que foi de grande ajuda na Série A-2. Já em 2009, a saída de atletas importantes do elenco foi inevitável e foi preciso trazer novos jogadores. Como sempre acontece, alguns deles irão sair-se bem, outros nem tanto. Também a comissão técnica deixou o clube, seduzida por uma oferta salarial melhor. Assim, será necessário formar uma nova “espinha dorsal”, o que exige tempo, independente da qualidade técnica dos novos atletas. E, se considerarmos “refugo” qualquer jogador que já tenha passado por um ou mais times “grandes”, basta olhar a escalação de qualquer das equipes que disputam esse Paulistão para ver que todas elas contam com jogadores nessas condições. Por que com o Ramalhão seria diferente? Pode-se até criticar a qualidade individual desses reforços, o que em geral contém uma grande dose de julgamento subjetivo, ou seja, palpite; mas, afinal, o torcedor tem essa liberdade.
Quanto às chances de rebaixamento, nada se pode afirmar a respeito enquanto não transcorrido pelo menos 20% do campeonato. Mas a estatística pode nos dar algumas pistas. Recorri aos arquivos da RSSSF e verifiquei alguns fatos interessantes. Por exemplo: no Paulistão, nos últimos 4 anos, quando se adotou o rebaixamento dos 4 últimos colocados, apenas duas equipes (Inter de Limeira e Rio Preto) entre as 16 relegadas estavam em seu primeiro ano na Série A-1. Três outras (São Bento, Rio Claro e Sertãozinho) caíram após 2 anos na elite estadual. Logo, a chance de uma equipe recém-promovida permanecer na A-1 é bem maior do que se imagina.
Já em termos nacionais, a situação é um pouco diferente, mas não tão alarmante como parece. Em 2006, das duas equipes promovidas uma caiu (Santa Cruz); em 2007, das 4 que se alçaram à elite, somente o América-RN não conseguiu permanecer nela. E no ano passado Ipatinga e Portuguesa não tiveram fôlego para continuar na Série A, mas foi a única oportunidade, desde que se instituíram na Série A os pontos corridos e o descenso de 4 equipes, em que dois “novatos” caíram. Portanto, ao menos estatisticamente a chance de uma equipe voltar à Série B logo no primeiro ano oscila entre 25% e 50%. Observando-se o que ocorre em campeonatos europeus, esses números de fato correspondem ao esperado.
Isso quer dizer que já estamos condenados? De modo algum, apesar de haver muita gente, principalmente na mídia esportiva, querendo ver o Ramalhão longe do Brasileiro. O sucesso de qualquer equipe tem pouco a ver com a sorte e muito com organização, qualidade técnica e tática e, principalmente, comando e organização (que faltaram por exemplo, à Portuguesa, ao demitir precipitadamente o treinador Benazzi). E nesses pontos o Ramalhão terá, sim, condições de garantir-se na Série A e surpreender os que condenam sua forma de gestão.
O que nos leva à última e mais contundente crítica. Não é de hoje que se fazem reparos à polêmica figura de Ronan Maria Pinto, e me parece que a crítica foi dirigida diretamente a ele e não à empresa-fundo que dirige. Longe de mim querer defender o distinto, mesmo porque ele já conta com um batalhão de advogados para fazê-lo. Mas devo alertar que é equivocado confundir o clube de futebol com a figura de seu(s) dirigente(s). O Santo André não é Ronan nem é a SAGED, assim como o Corinthians não era a MSI, o Dualib ou aquele iraniano de nome irreproduzível. Além disso, a opção de terceirizar o futebol profissional do Ramalhão partiu do ex-presidente Jairo Livólis, bem antes portanto que o Sr. Pinto aparecesse por lá.
É desconfortável para alguns torcedores apoiar um time que deixou de ser um simples clube de futebol para tornar-se uma empreitada comercial? Talvez, mas isso depende do julgamento de cada um. Mas o futebol hoje tornou-se um grande negócio, e se o ECSA não partisse para esse caminho não chegaria aonde chegou nem existiria por muito tempo mais – ou cairia no semiprofissionalismo da A-3, como já ocorreu com tantos times tradicionais. Como alguém escreveu na lista uma vez: se você quer entrar para o circo, vista uma roupa de palhaço e seja o melhor deles, senão será comido pelos leões.
A quem realmente não suportar essa situação, resta olhar para o berço do futebol, a Inglaterra, que tem a Liga mais milionária do planeta e cujos principais clubes estão nas mãos de investidores estrangeiros, nem todos eles com boa reputação. Torcedores do Manchester United, inconformados com a venda de seu time de coração para um empresário norte-americano dono de franquias da NFL, fundaram um novo clube, o Uniteds of Manchester, para “manter acesa a chama do verdadeiro futebol”. Não sei se terão êxito. Mas não deixa de ser um protesto contra a mercantilização do futebol, na qual o E.C. Santo André, para o que der e vier, embarcou decididamente.